quarta-feira, 20 de julho de 2011

Talisca




Hoje deixo-te aqui. Fica quieto. Descansa. Sim, hoje está sol, mas não sei se queima. Importa isso? Hoje levo só o meu corpo. Deixo uma talisca aberta. Pode ser da porta escondida do lado de lá do meu jardim, e pelo sim pelo não, a chave fica junto às folhas de hortelã. Pode precisar. Quem sabe ele não passa por aqui. É que o mundo dá muitas voltas, diz o povo e povo por vezes é sábio. Vou escolher-me vestir qualquer coisa leve. Impossível não lembrar do que ele gosta, não precisas dar palpites, aliás hoje o teu palpite é de calmaria e ficar por aqui. Por isso eu escolho. Não sussurres. O vestido? Sim pode ser esse. Suave. Ele diz que os meus vestidos são suaves como o meu tamanho! Preciso de um trato na minha pele. Hidratar das lembranças de outros dedos. Hoje fico pelo creme, sozinho, sem cheiro de mel. E tu continuas a palpitar e pergunto-te porque és tão impaciente. Não te apoquentes. O cabelo nos meus ombros esconde o vazio de tu não estares. Ninguém sabe disso. Pronto! Os meus olhos?! Sim, são o teu reflexo, mas vou prepara-los. Sabes que sou exímia nessas coisas. E o verde também trai, sabes isso! Também trai os meus sentimentos, logo, difícil, alguém perceber que este brilho é único e exclusivamente uma pincelada estética! Esse teu suspiro é inútil. Disseste que estavas fechado para balanço. Pois então! Balança na sombra. Também é bom um instante só para ti. Sem azáfama dos sentidos, sem odores que aceleram as tuas batidas, sem os olhos te encherem de lugares de saudade, sem pedires aos meus dedos que toquem o inatingível. Bom para ti acalmar o ritmo da memória. Eu volto logo. Sei que estarás igual. Quieto e só. Voltas para dentro de mim, quando eu despir o meu vestido, a noite me roubar o sol e a chave permanecer junto às hortelãs. A talisca? Essa poderá ficar. Quem sabe o povo não tem razão!

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