quarta-feira, 27 de julho de 2011

A outra



A outra! Determinante demonstrativo! Determina a demonstração do afecto gratuito. Abraços, colo, riso, sorrisos, silêncios de mãos dadas. Sonhos, além-mar! Reais, naquela praia! Apenas!
Odores e pele misturada. Gemidos, na mesma linguagem de dois corpos. Encaixe. Saudade. Espera. Entrega!
Segredo e cúmplice de duas vidas!
Coragem! E coragem, novamente!
Lágrimas e troca! Borboleta quieta por detrás da janela, do lado de fora do jardim perfeito. Melodias, músicas, poemas! Palavras esculpidas. Atiradas, pinceladas, no mar, na espuma, na areia! Grito mudo, aqui dentro. Grito chorado, transparente. A outra! Numa lista de coisas de outras coisas!
Primeiro o jardim, segundo, o sumo de laranja e a torrada, pousada no prato de porcelana. Em terceiro, a camisa engomada e o cheiro a lavanda! Em quarto, um quarto de apenas meio quarto de desejo e de pele!
E a outra, determinante demonstrativo do acessório, dispensável na hierarquia do apenas bem parecer!

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Aconchega-a...de vez em quando!



Contei quase todas as horas esta madrugada. Espalhei o meu cabelo, agora ondulado, no lugar vazio, branco, matizado apenas pelo odor da minha pele sem sinais teus.
E quando quase adormecia, acordavam-me as gaivotas, que insistem em estar ali, longe do mar. Cheirava a terra queimada, vinha de lá de fora o cheiro a quente, de um fogo que já não é gélido. A varanda continua paralela à linha do teu horizonte. Tu continuas paralelo à linha da minha vida. Só sei que não sais aqui de dentro. Disseram-me as cartas! Era inevitável que aparecesses por aqui, neste lugar meu. E porque não pode haver coincidências, permaneces nele. Ficarás nele. Creio que é isto, que se chama entregar a alma. Entreguei-te a minha. Já não tenho mais nenhuma para poder entregar, dar, enfim, presentear, a um outro. Um qualquer! Indefinido!
Inquieta-me onde a colocaste. Onde a guardaste. Em que vida tua?! Não gostaria de a saber por ai! Gosto do aconchego. Onde a defines? Onde está? Cuidas dela, de vez em quando?!
Escasseia o teu tempo! É o peso da instituição da tua assinatura em papel timbrado, religiosamente obedecido, com cheiro a flores, num altar, algures endeusado, perto de uma virgem plena de convenções sem emoção e toque sentido.
E o nome! O teu nome pronunciado na Vila, por nomes de rostos abstractos, alheios à tua própria alma! O teu nome convencional! Não o nome que te dei e que tatuei a tinta permanente, aqui na pele que te absorveu, inteira.
A minha alma é leve! As tuas convenções de um peso incomensurável! Em desequilíbrio, portanto, numa das tuas vidas! Onde a colocaste? Dentro da tua? Ou do lado de fora do teu outro nome?!
Basta que a aconchegues. De vez em quando!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Estrela-do -mar



Era um veleiro que ondulava suave ao ritmo da maré cúmplice. As velas eram asas de gaivota livre, perdidamente livre. E o vento Norte mantinha-se calmo na linha curva do horizonte alaranjado.
Amavam-se ali. Ou seria algo semelhante ao verbo amar! Ela não sabe muito bem. Lembra-se apenas, como se «apenas» fosse a eternidade, que se despia sem pudor! E ele cobria-a com cheiro a maresia e pintava-a com os sinais quentes da sua pele morena. Lembra-se que confundiam gemidos com os gemidos desse veleiro que rompia impetuoso, as ondas esbranquiçadas do verde-mar. Lembra-se do seu peito pequeno e nu, escondido do sol, protegido como pérolas em conchas doces e fortes, nas mãos dele, enquanto a segurava, na escalada exímia, pelo seu corpo grande de homem. Ele olhava-a. Encaixada em si. Fechava então os olhos num suplício de luxúria. E dançavam, ondulavam, tatuavam-se. Fundiam-se. Esculpiam-se da mesma matéria!
Lembra-se do depois! Quando o sol descia até ao sal e ele sossegava no seu abraço enlaçado.
A bússola apontava o sul. Ambos esqueciam o Norte. As velas descidas em silêncio, as gaivotas descansadas na areia. E sonhavam-se, os dois, além-mar!
Um dia adormeceram no desnorte! O vento soprou forte, o mar revolveu-se, transformou-se em cinza de pranto. Rasgaram-se as velas e voaram para longe as gaivotas assustadas. O pranto do mar encheu, de um sorvo só, o veleiro desgarrado. Não de água salgada nem de areia fina, nem de búzios ou estrelas. Mas de flores de todas as cores! E eram tantos os amores-imperfeitos, e as rosas de vermelho sangue, os morangos agrestes e os malmequeres pérfidos. E ela sufocava, e o respirar doía!
Olhou-o uma última vez. Perdido no jardim perfeito que inundava a maresia de ambos. Soltava as velas rasgadas, limpava e sacudia a areia, devolvia os búzios e as estrelas-do-mar, desfazia o sal da sua pele. Depois, devolveu-a ao mar de corpo e alma, embrulhada no sonho de o esperar. O veleiro partiu com ele. Repleto de flores de sementes amorfas, as gaivotas transformadas em mariposas tristes e estéreis. E o mar dissolveu-se num rio parado, turvo e falso.
Diz-se que o veleiro se transformou num girassol enorme. Diz-se que apenas enfrenta o sol ao fim do dia, quando os vizinhos recolhem a casa. Diz-se que o seu jardim não cheira a rosas mas a maresia.
Diz-se que guardou uma estrela-do-mar, branca e pequena, em segredo, numa caixinha de coral de madeira, que lhe sussurra sorrisos, quando a saudade aperta a sua alma, junto à margem do seu rio turvo!
Diz-se!

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Vácuo...



Trocou o mar pela serra. Sozinha, sem o estar, ao fim da tarde, numa caminhada entre cardos, hortelã e toda a miscelânea de verde que não reconhece.
E o turbilhão de sentimentos de cores tão diferentes. O lilás, o branco, e o cinza. Este último que paralisa a vontade de decidir, de pensar, de seguir caminho. Este aqui, da cor da mochil...a que carrega o peso da pedra que teima em levar até ao cimo da montanha!
E o sol do outro lado, perto do seu mar que hoje perdeu o sal, a espuma e deve estar revolto, desgarrado, perdido, sem saber qual das sete ondas molhará de novo os dois!
E o amor impossível que não acontece, e que se ouve falar, em surdina, nas vozes de pessoas alheias ao sentir. E não há amores impossíveis, pensa ela! Das duas uma, ou se ama e se torna o amor possível, ou então tudo se contundiu e não era amor!
E não se fala do amor e de uma cabana. E não se lê uma história de uma princesa e fadas que trazem um príncipe belo, que a acorda de um longo sono, para a felicidade. Não é o enredo de uma novela de um canal qualquer da TV! ´
É quase o amor, sem o ser! É uma indefinição rodeada de coisas. Coisas! Casas, flores, sumo de laranja, salmão grelhado, um hotel exótico, uma camisa engomada a preceito. É um nome num sítio, gente conhecida, é o exemplo! São coisas! Que impedem de quantificar o sentimento que se guarda dentro do peito. São coisas demasiado importantes para tirar da mochila! O amor não cabe dentro dela! Nem na bolsinha de fora, que tem um zipper minúsculo! Quando muito aquele canivete suíço pequeno, de funções variadas, que cabia no bolso dos jeans, tal como ela cabia na palma da sua mão! Logo, não é o amor que cabe na mochila! Quando muito a imagem que se tem dele!
E é a revolta, e a angústia silenciosa, e o medo. As memórias. A perda. O tudo e o nada! O olhar o tempo parado. O diálogo mudo de sentido na mensagem que ele passa. O monólogo da solidão, a espera dela. A ausência ocupada dele, em justificações contraditórias ao seu sentir. O vácuo, na falta de coragem do virar a mesa num jogo limpo! As cartas de um baralho sem trunfos!
E ou se ama e é possível, ou não se ama e não é possível! O princípio lógico do terceiro excluído, sem meio-termo, sem hipóteses, sem aspas, sem talvez!

Sentido Obrigatório



Vem comigo. Escolhi o meu vestido mais leve, aquele tal, da imensidão do branco, aquele tal que despias devagar e o trocavas pela minha pele, dourada pelo sol. Vem! Ondulei o meu cabelo, com a espuma do mesmo mar que te adoçava em bruma de banho salgado. Anda rápido. Porque a música com que eu escalava o teu corpo, quase adormece na rádio, e dormentes, tenho eu os meus lábios, do gosto que tu gostavas de provar. O meu perfume ainda é o mesmo, lacre puro, no colar, que meigo e ágil, colocaste, pendente no meu peito. Como pendente ficou o teu odor, no enredo entre o dourado prateado das cores que compõem o nosso pronome. Vem, sem demoras! Esse teu silêncio de palavras que não são para mim, cansam-te o rosto e o riso, e, o nosso sítio tem a mesa vazia, com duas chávenas do mesmo café de chocolate. Aquela mesma, lembras-te? Colada à janela que parava o mundo lá fora e abria o horizonte de sonhos rasgados na linha do mar. As pessoas conhecidas perguntam-me por ti com os olhos, e eu respondo que estás quase, mesmo quase a chegar! Vem comigo! Mas ele não foi! Fechou os olhos e viu o vestido dela, branco e despido, sonhou o cheiro dela, enredado no seu. Sorriu no brilho do colar pendente no seu peito. Respirou de um só trago a maresia escondida no cabelo ondulado dela, saboreou o café de chocolate nos lábios do gosto que ele gostava. Fechou os olhos e imaginou a janela de sonhos na linha do horizonte. Acordou, na voz que lhe apontava um outro caminho. Fechou o sorriso e o riso. Olhou as suas mãos vazias e cheias de coisas, viu a sua alma em pena perpétua, presa, a um outro alguém, sem sabor e sem cheiro. Sem chave, que abrisse as amarras da sua escolha obrigatória, dessas coisas que lhe esvaziam o ser!

Condicional



Não sei as horas que nos separam. Não medi a distância da linha do horizonte, aqui atrás da desta serra que me envolve. Sei que estás além dessa linha, num cansaço de nomes que por vezes te calam a voz e envolvem de silêncio os teus olhos. Se eu passasse a ponte ficaria bem perto de ti. Mas a estrada puxa-me para o mar que fica na foz do teu rio calmo.

Sabes, hoje olhei essa linha. Estava mesmo junto ao meu jardim ainda por florir com flores requintadas. É imperfeito o meu jardim. Não tem rosas, nem amores-perfeitos. Pensei em ti. Misturamos sempre tantos sabores e odores. Sorri na desordem de flores amarelas sem nome. Colhi uma mão cheia delas e percebi o cheiro a hortelã que as salpicava. A minha casa hoje tem flores do campo em desordem com folhas de hortelã. Assim como as da tua montanha. Aproveitei antes do meu jardim se tornar no meu mundo doméstico de uma mesma perfeição igual à tua.

Quase esquecia de te dizer, neste enlevo que te lembra, que mudei de perfume. Não mudei nem a pele nem a cor dos meus olhos. Por isso acredito que me sintas, mesmo com um perfume diferente, envolvendo o meu corpo, moldado ainda pelas tuas mãos. E sei que o verde dos nossos olhos se mistura ainda, pelo desejo dos nossos dedos, que desenham os mesmos gestos nos mesmos lençóis. Misturaste-te com o meu odor. E aqui, na minha cama vazia e sem espaço livre para qualquer outro corpo, ainda te cheiro, no movimento do meu cabelo meticulosamente liso.

Sabes, este silêncio trazido nas tuas últimas palavras sabem a sal, sem a doçura do teu toque meigo doce. Porque o teu corpo é um rio, e o rio é doce, e sempre se encontrou em mim, salgada. Por isso éramos a mistura perfeita. A miscelânea de sentidos, consentida numa emoção quase racional. E eu não sei ainda escrever palavras no pretérito passado. Talvez porque nunca as tivéssemos escrito no futuro. Nem num futuro próximo, sequer! E este presente soa a incompleto e o meu coração ainda não «fechou a porta», e tu não ensurdeces o ruído da minha saudade.

E bastava apenas que eu atravessasse a ponte. Mudasse a estrada de cheiro a mar, e escalasse a tua montanha, como eu fazia pelo teu corpo, e tu deixavas, numa quietude límpida, pura e grande como tu!

Perfeição!



Poderia sim, continuar a amar-te no silêncio proibido. Poderia ser o outro lado da balança que te equilibra no sorriso, no sexo, no riso, no teu eu que só sabe ser comigo. Poderia ser isso tudo. Hoje, amanhã. Na próxima semana e no mês onde o calor torna os corpos sedentos de areia. Depois calcarias comigo as folhas primeiras do Outono. As minhas cores favoritas que tu sabes que me caem bem. Pegarias na minha mão e brincarias com os meus dedos. Puxavas-me de encontro ao teu peito, onde me aninharia quieta. Poderia ser tua sempre. Trocaríamos presentes em Dezembro. O meu caberia no teu bolso. Assim como cabe o meu coração no teu peito. E tu és o equilibrista perfeito enquanto abres a porta do teu mundo perfeito como tu. Um dia questiono-me. Pergunto-te se estou bem sentada ao teu lado nesse equilíbrio frágil da tua balança. Dizes que sim. Mas eu mexo-me mais um pouco. Caio. Saio do virtual da tua perfeição. Regresso ao meu real quotidiano, imperfeito. As minhas mãos estão ásperas. O meu vestido guardado. Volto a olhar para mim. A minha vida de horas certas e mesmas.

Agarras-me? Não. Não podes. Mesmo em desequilíbrio de vidas tuas. Deixas o riso, pesas de novo o teu eu incompleto, sorris apenas. O teu outro lado da balança é raso. Resvala. Toca na relva perfeita do teu jardim perfeito. O sexo será apenas sexo. Sem dedos nem alma quieta no teu colo. Chamam-te para um lanche apetecível, de uma fatia de bolo numa tarde chuvosa de Páscoa. Sentas-te, normalmente no teu sofá confortável. Talvez seja essa a definição mais próxima de amar: amar é saber como agradar o outro com uma simples fatia de pão-de-ló!

Olhas pelas vidraças e bocejas aborrecido porque a chuva te impede de molhar o teu corpo na água da piscina. Num repente sentes apenas o peso incomensurável do teu corpo. Levantas-te e sem pensar, olhas-te ao espelho do teu quarto vazio de duas pessoas. Vês-me no fundo dos teus olhos. Percebes que ali está a tua alma. Mas não é dela que te alimentas. Olhas em redor. Tudo imaculado. Tudo nos sítios certos. Abres mecanicamente uma gaveta. Cheira a lavanda a tua roupa. E as tuas camisas caprichosamente engomadas sentem falta das minhas mãos que as desconcertam. Tu também sentes. Mas preferes o prato da balança em desequilíbrio a resvalar pela relva do teu perfeito jardim. És forte. Suficientemente forte. Depois sempre tens a fatia fresquinha do bolo à tua espera. À noite sabes que a caixa mágica do teu portátil te trará sorrisos suficientes que te façam esquecer a tua alma. Depois voltarás para a tua cama de dois. Tu com toda a certeza esconderás o teu corpo grande, quieto, do lado direito da cama. Irás fechar os olhos de um cansaço falso. Ouves uma respiração que não a minha e por instantes desejas o meu corpo pequeno enroscado ao teu. Cerras com mais força os teus olhos. E guardas-me neles, para que no dia seguinte, no mesmo espelho, possas voltar a ver a tua alma. Até um dia. Em que já lá não viverei e o prato da balança frágil se quebra, e ficarás apenas com o amar numa eterna fatia de bolo de pão-de-ló, no cheiro da tua roupa a lavanda e na perfeição das tuas camisas engomadas!

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Talisca




Hoje deixo-te aqui. Fica quieto. Descansa. Sim, hoje está sol, mas não sei se queima. Importa isso? Hoje levo só o meu corpo. Deixo uma talisca aberta. Pode ser da porta escondida do lado de lá do meu jardim, e pelo sim pelo não, a chave fica junto às folhas de hortelã. Pode precisar. Quem sabe ele não passa por aqui. É que o mundo dá muitas voltas, diz o povo e povo por vezes é sábio. Vou escolher-me vestir qualquer coisa leve. Impossível não lembrar do que ele gosta, não precisas dar palpites, aliás hoje o teu palpite é de calmaria e ficar por aqui. Por isso eu escolho. Não sussurres. O vestido? Sim pode ser esse. Suave. Ele diz que os meus vestidos são suaves como o meu tamanho! Preciso de um trato na minha pele. Hidratar das lembranças de outros dedos. Hoje fico pelo creme, sozinho, sem cheiro de mel. E tu continuas a palpitar e pergunto-te porque és tão impaciente. Não te apoquentes. O cabelo nos meus ombros esconde o vazio de tu não estares. Ninguém sabe disso. Pronto! Os meus olhos?! Sim, são o teu reflexo, mas vou prepara-los. Sabes que sou exímia nessas coisas. E o verde também trai, sabes isso! Também trai os meus sentimentos, logo, difícil, alguém perceber que este brilho é único e exclusivamente uma pincelada estética! Esse teu suspiro é inútil. Disseste que estavas fechado para balanço. Pois então! Balança na sombra. Também é bom um instante só para ti. Sem azáfama dos sentidos, sem odores que aceleram as tuas batidas, sem os olhos te encherem de lugares de saudade, sem pedires aos meus dedos que toquem o inatingível. Bom para ti acalmar o ritmo da memória. Eu volto logo. Sei que estarás igual. Quieto e só. Voltas para dentro de mim, quando eu despir o meu vestido, a noite me roubar o sol e a chave permanecer junto às hortelãs. A talisca? Essa poderá ficar. Quem sabe o povo não tem razão!