sexta-feira, 22 de julho de 2011

Estrela-do -mar



Era um veleiro que ondulava suave ao ritmo da maré cúmplice. As velas eram asas de gaivota livre, perdidamente livre. E o vento Norte mantinha-se calmo na linha curva do horizonte alaranjado.
Amavam-se ali. Ou seria algo semelhante ao verbo amar! Ela não sabe muito bem. Lembra-se apenas, como se «apenas» fosse a eternidade, que se despia sem pudor! E ele cobria-a com cheiro a maresia e pintava-a com os sinais quentes da sua pele morena. Lembra-se que confundiam gemidos com os gemidos desse veleiro que rompia impetuoso, as ondas esbranquiçadas do verde-mar. Lembra-se do seu peito pequeno e nu, escondido do sol, protegido como pérolas em conchas doces e fortes, nas mãos dele, enquanto a segurava, na escalada exímia, pelo seu corpo grande de homem. Ele olhava-a. Encaixada em si. Fechava então os olhos num suplício de luxúria. E dançavam, ondulavam, tatuavam-se. Fundiam-se. Esculpiam-se da mesma matéria!
Lembra-se do depois! Quando o sol descia até ao sal e ele sossegava no seu abraço enlaçado.
A bússola apontava o sul. Ambos esqueciam o Norte. As velas descidas em silêncio, as gaivotas descansadas na areia. E sonhavam-se, os dois, além-mar!
Um dia adormeceram no desnorte! O vento soprou forte, o mar revolveu-se, transformou-se em cinza de pranto. Rasgaram-se as velas e voaram para longe as gaivotas assustadas. O pranto do mar encheu, de um sorvo só, o veleiro desgarrado. Não de água salgada nem de areia fina, nem de búzios ou estrelas. Mas de flores de todas as cores! E eram tantos os amores-imperfeitos, e as rosas de vermelho sangue, os morangos agrestes e os malmequeres pérfidos. E ela sufocava, e o respirar doía!
Olhou-o uma última vez. Perdido no jardim perfeito que inundava a maresia de ambos. Soltava as velas rasgadas, limpava e sacudia a areia, devolvia os búzios e as estrelas-do-mar, desfazia o sal da sua pele. Depois, devolveu-a ao mar de corpo e alma, embrulhada no sonho de o esperar. O veleiro partiu com ele. Repleto de flores de sementes amorfas, as gaivotas transformadas em mariposas tristes e estéreis. E o mar dissolveu-se num rio parado, turvo e falso.
Diz-se que o veleiro se transformou num girassol enorme. Diz-se que apenas enfrenta o sol ao fim do dia, quando os vizinhos recolhem a casa. Diz-se que o seu jardim não cheira a rosas mas a maresia.
Diz-se que guardou uma estrela-do-mar, branca e pequena, em segredo, numa caixinha de coral de madeira, que lhe sussurra sorrisos, quando a saudade aperta a sua alma, junto à margem do seu rio turvo!
Diz-se!

2 comentários:

  1. Dizem... Mas ninguém sabe.
    Só o sabe o peito vazio, cheio de sombras e ecos infinitos.

    Deixo-te um beijo, minha querida :)

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  2. Dizem, mas alguém sabe, ele sabe....junto à margem do seu rio turvo....

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